“Vós todos sois o corpo de Cristo e, individualmente, sois membros desse corpo. Assim, na Igreja, Deus estabeleceu, primeiro, os apóstolos; segundo, os profetas; terceiro, os que ensinam; depois, dons diversos: milagres, cura, beneficência, administração, diversidade de línguas. Acaso todos são apóstolos? Todos são profetas? Todos ensinam? Todos fazem milagres? Todos têm dons de cura? Todos falam em línguas? Todos as interpretam? Aspirai, porém, aos dons mais elevados” (1Cor 12,27-31).
Meus sempre amados irmãos e irmãs, que formamos o corpo de Cristo, a comunidade santa e pecadora do Povo e da Família de Deus: estejam com todos vocês a graça e a paz do Senhor Jesus pela ação do Espírito Santo:
A Igreja Católica no Brasil faz do mês de agosto o Mês das Vocações. Porque, então, citar aqui essa admoestação de São Paulo aos Coríntios? Que importância têm os dons de cada um no contexto eclesial? O que têm a ver os dons do Espírito Santo com vocação? Que atitudes assumir para corresponder fielmente ao chamado do Senhor e vivê-lo em plenitude? Para responder a estas e outras eventuais perguntas a respeito do tema, proponho alguns pontos visando a uma breve reflexão.
1. Escolha, chamado e envio pelo Pai através do Filho pelo Espírito Santo. No batismo, ao sermos enxertados na própria vida divina pela graça, somos escolhidos e articulados como membros num só corpo que, como nos ensina o Apóstolo, é o corpo de Cristo, a Igreja. E, então, já se manifestam em cada um os dons do Espírito ou carismas que correspondem à vocação para a qual todos somos chamados: a vocação à santidade: “Santificai-vos e sede santos, porque eu sou santo” (Lv 11,44). E, na palavra de Jesus, ser santo é ser perfeito como o Pai: “Sede, portanto, perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48). A vocação à santidade é compreendida, portanto, como uma escolha do Senhor e como um seu chamado a todos os batizados e não, unicamente, aos sacerdotes ou aos religiosos ou aos consagrados e consagradas. E aqueles mesmos carismas ou dons – como os chama São Paulo – ajudam-nos a tornar concreta nossa resposta à medida que os colocamos a serviço da comunidade humana e eclesial. E, como Deus concede os carismas - especiais, a cada um -, cada um deverá manifestá-los vivenciando a sua própria vocação. Escrevendo ao seu dileto filho espiritual e discípulo muito amado, Timóteo, São Paulo lembra que: “Deus nos salvou e nos chamou com uma vocação santa, não em atenção às nossas obras, mas por causa do seu plano salvífico e da sua graça, que nos foi dada no Cristo Jesus antes de todos os tempos” (2Tm 1,9).
2. Resposta do escolhido, vocacionado e enviado: assumir o envio. Num dos mais preciosos documentos do magistério eclesiástico do século passado, “A Evangelização no mundo contemporâneo” (EN), o Papa Paulo VI assim se expressa quanto à vocação da Igreja e de cada um dos cristãos católicos: “A Igreja sabe-o bem, ela tem consciência viva de que a palavra do Salvador, "Eu devo anunciar a Boa Nova do reino de Deus", se lhe aplica com toda a verdade. Assim, ela acrescenta de bom grado com São Paulo: “Anunciar o Evangelho não é título de glória para mim; é, antes, uma necessidade que se me impõe”... “Ái de mim, se eu não anunciar o evangelho”... "Nós queremos confirmar, uma vez mais ainda, que a tarefa de evangelizar todos os homens constitui a missão essencial da Igreja"; tarefa e missão, que as amplas e profundas mudanças da sociedade atual tornam ainda mais urgentes. Evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade. Ela existe para evangelizar, ou seja, para pregar e ensinar, ser o canal do dom da graça, reconciliar os pecadores com Deus e perpetuar o sacrifício de Cristo na santa missa, que é o memorial da sua morte e gloriosa ressurreição” (EN 14). E o mais recente e luminoso Documento de Aparecida insiste no caráter missionário do discípulo de Jesus e o exprime já no seu lema: Discípulos missionários de Jesus Cristo para que nEle, nossos povos tenham vida”. Ora, sendo vocação e missão de toda a Igreja anunciar a Boa Notícia a toda a humanidade, para todo o católico cristão, leigo ou consagrado, para aquele no meio das duras realidades do mundo, independente de permissão ou mandato ou, até, dependência de bispos ou de sacerdotes, constitui a concretização de sua vocação laical.
3. A orientação de Jesus aos escolhidos, vocacionados e enviados. Ao enviar os seus discípulos em missão, Jesus lhes dá orientações muito claras: “Ide, antes, às ovelhas perdidas da casa de Israel!” (Mt 10,6). Vivemos num tempo no qual tantos filhos e filhas da Mãe Igreja abandonam a casa paterna, aderindo a outras crenças ou ideologias, seduzidos por propostas nem sempre condizentes com os critérios e valores anunciados por Jesus no Evangelho. E o fazem, talvez, movidos pela esperança de um sucesso imediato, ou pelas facilidades de alcançar o ter e o poder, ou em busca de sonhadas facilidades ou tentando resolver, quem sabe, problemas de ordem pessoal ou familiar... (Cf.DAp 100, letra f). Por isso, nossos Pastores, também no Documento de Aparecida (DAp), lançam um apelo urgente: “A Igreja é chamada a repensar profundamente e a relançar com fidelidade e audácia sua missão nas novas circunstâncias latino-americanas e mundiais” (DAp 11). E, mais: “Aqui está o desafio fundamental que afrontamos: mostrar a capacidade da Igreja para promover e formar discípulos e missionários que respondam á vocação recebida e comuniquem, por toda a parte, transbordando de gratidão e alegria, o dom do encontro com Jesus Cristo” (DAp14). É neste contexto que me permito deixar aqui uma pergunta, talvez incômoda: será que nós, vocacionados e enviados para as “ovelhas perdidas da casa de Israel” (refiro-me, sobretudo, a alguns Movimentos eclesiais que deveriam distinguir-se por sua missão de busca dos afastados da Igreja, como o Movimento de Cursilhos, por exemplo) não continuamos buscando, quase sempre, as mesmas ovelhas já bem protegidas e melhor nutridas no calor do redil, enquanto milhares e milhares estão lá fora, abandonadas, e morrendo de fome e frio?
4. Desafios e riscos que esperam os escolhidos, chamados e enviados em missão. Assim como os primeiros discípulos, os de hoje somos enviados a um mundo globalizado, tanto para o bem, mas, sobretudo para o mal incalculável que é o distanciamento do Deus da vida, do seu plano de amor; globalizado numa cultura de morte e destruição dos valores fundamentais da dignidade humana, da família e da convivência entre semelhantes: “Eis que vos envio como cordeiros para o meio de lobos” (Lc 10,3). E, talvez, um dos maiores e mais insidiosos desafios esteja, muito mais frequentes do que nos tempos de Jesus, naqueles que se apresentam camuflados: “Eis eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos” (Lc 10,3). Nestas circunstâncias adversas à fé cristã, temos que pedir, com insistência e perseverança, o dom do Discernimento!
5. Atitudes que Jesus espera dos escolhidos, chamados e enviados em missão. São aquelas atitudes derivadas da opção fundamental feita pelos que são chamados, consagrados ou leigos e leigas, para trabalhar na vinha do Senhor: “De graça recebestes, de graça deveis dar! Não leveis ouro, nem prata, nem dinheiro à cintura; nem sacola para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem bastão, pois o trabalhador tem direito a seu sustento” (Mt 10, 8-10). O seguimento nas pegadas do Mestre; a cruz abraçada com alegria; a renúncia constante e a oração perseverante constituem o mais seguro itinerário dos vocacionados para a sublime aventura evangelizadora!
6. A recompensa reservada aos escolhidos, chamados e enviados em missão. Simples assim: “Neste encontro com Cristo, queremos expressar a alegria de sermos discípulos do Senhor e de termos sido enviados com o tesouro do Evangelho” (DAp 28). E, ainda: “Conhecer a Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (DAp 29). Alegria! Alegria” Alegria!
Concluo com a presença de Maria, a primeira escolhida, chamada e enviada: “Que (Maria) nos ensine a sair de nós mesmos no caminho de sacrifício, de amor e serviço, com o fez na visita à sua prima Isabel, para que, peregrinos a caminho, cantemos as maravilhas que Deus tem feito em nós, conforme a sua promessa” (DAp 553). A todos os meus amados, deixo-lhes um carinhoso abraço fraterno no Senhor Jesus. De todos, servidor e irmão,
Pe. José Gilberto Beraldo
Equipe Sacerdotal do GEN